MS: Consórcio de milho-guandu aumenta teor de proteína em até 50% na alimentação animal
O inverno está à porta. Os pastos empobrecem em nutrientes. A dieta do rebanho perde a qualidade e manter os índices de produtividade da época das águas não é fácil. Quem opta pela silagem como estratégia para a produção de leite, carne ou lã nesse período sabe o quanto um alimento nutritivo faz a diferença na balança. De olho no problema, pesquisadores da Embrapa resolveram incrementar a nutrição animal adicionando feijão-guandu à silagem de milho.
Os dados iniciais em experimentos conduzidos na Embrapa em Campo Grande (MS) indicam que a adição entre 10 e 20% de guandu ao milho é capaz de aumentar o índice de proteína bruta na alimentação dos bovinos em até 50%, ou seja, alimentados com essa mistura, as probabilidades de ganho de peso aumentam. Dessa forma, o consórcio milho-guandu produzido em sistemas integrados torna-se uma fonte de alimento para o período da seca.
"No volumoso de milho solteiro, o nível de nutrientes digestíveis totais (NDT) é de 61% e a proteína, 9%. Com a adição de 10% de guandu, o NDT cai para 58%, mas a proteína bruta sobe para 11,5%. Já com 20% da leguminosa, o NDT vai para 57% e a proteína atinge 13,5%. Consideramos a faixa entre 10 e 20% ideal, com aumento no valor da proteína em até 50%, o ganho proteico é maior do que a perda de energia", explica José Alexandre Agiova da Costa, pesquisador da Embrapa. Os efeitos da adição de guandu na silagem foram avaliados durante o doutorado da bolsista Andreia da Cruz Quintino, da Universidade Federal do Mato Grosso, e acompanhados pelos pesquisadores Roberto Giolo de Almeida, Ademir Hugo Zimmer e Alexandre Agiova.
Animais com mais peso
O pesquisador em nutrição animal da Embrapa Rodrigo da Costa Gomes observou resultados significativos. "Na dieta de um garrote de 300 kg, elevar a proteína de 9% para 13,5% significa aumentar o consumo de proteína em, aproximadamente, 315 gramas e é muito provável que o aumento também eleve o ganho de peso do animal", acredita o especialista. Antes mesmo de a ciência disponibilizar ajustes finais em relação ao consórcio, os produtores já o colocaram em testes nas propriedades e as respostas ratificam os resultados preliminares. "Notamos 200 gramas de peso vivo de ganho a mais por dia, comparado com o animal que se alimentou de silagem de milho solteiro", anima-se o produtor Jorge Gaeti Ferreira Camargo, de Bela Vista (MS).
Gomes simula um confinamento comum, de cem dias, com machos de 400 kg de peso vivo ao início. Admite-se que o ganho de peso diário normal é de 1,5 kg/dia, ao final há um boi com 550 kg que, abatido, renderia 19,8 arrobas de carcaça, o que hoje daria uma receita de R$ 2.831,40. Já a silagem consorciada resulta em um ganho a mais de peso de 200 gramas por dia, no mesmo confinamento. Ao final, tem-se um animal com 570 kg que, abatido, resultaria em 20,5 arrobas de carcaça produzindo uma receita de R$2.934,36. "A silagem consorciada resulta em um ganho de peso de 13%, refletindo em um aumento de R$ 102,96 na receita por animal. Em um confinamento médio de 500 cabeças, isso significa um aumento de R$ 51.480,00", estima o pesquisador.
Em Bela Vista, o médico-veterinário Jorge Camargo não fala em cifras, mas conta que, apesar do custo adicional da semente da leguminosa, a adoção experimental do consórcio em uma área de cinco hectares permitiu a terminação de 200 cabeças e proporcionou um retorno considerável. "Neste plantio, comparando-se com a silagem de milho solteiro, gastamos no total R$ 150 reais por hectare, produzindo uma média de 30 toneladas de silagem consorciada, com oferta de 20 kg/animal/dia no cocho. É uma grande relação custo-benefício", avalia Camargo, que para melhorar a propriedade de 420 hectares com essas e outras iniciativas participa do Programa Mais Inovação do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural do Mato Grosso do Sul (Senar/MS), em parceria com a Fundação MS para a Pesquisa e Difusão de Tecnologias Agropecuárias.
Detalhes da prática consorciada
Os estudos iniciaram-se em 2008, com a participação dos pesquisadores Alexandre Agiova, Ademir Zimmer, Roberto Giolo, Fernando Alvarenga Reis, Alexandre Romeiro e Rodrigo Gomes e suporte financeiro da Associação para o Fomento à Pesquisa de Melhoramento de Forrageiras (Unipasto). "Testamos o guandu, a soja perene, o estilosantes e a crotalária em consórcio com o milho, com o objetivo de inserir uma leguminosa no sistema de Integração Lavoura-Pecuária (ILP) para uso na alimentação e como plantas de cobertura. O guandu, por suas características, sobressaiu-se e passamos a observá-lo mais de perto", recorda Zimmer.
O plantio, na região Centro-Oeste, é recomendado a partir de novembro, período das águas, tanto de milho quanto de guandu, com espaçamento de 0,45 cm, alternando as culturas. A leguminosa germina de cinco a sete dias depois que o cereal é plantado. Ambos têm porte semelhante, com a diferença de não entrar em competição e nem sofrer sombreamento acentuado. Doutor em manejo de pastagens, Zimmer explica que em uma mesma operação, o produtor planta e colhe todo o material para ensilagem, no ponto de colheita do milho. Pode-se fazer o plantio em uma linha ou em duas, dependendo do maquinário e do planejamento da propriedade.
"O consenso para quem trabalha com ILP é o ganho no sistema. Pode-se eventualmente ocorrer uma perda na produtividade da lavoura, porém, em uma pastagem como fonte de alimento na seca, o retorno virá no ganho animal, com a produção de leite, carne ou lã, e na economia com a alimentação no cocho", completa Agiova. A próxima etapa das pesquisas é avaliar a prática utilizando o milho safrinha, e formar um banco de proteína com leguminosas, chamado de legumineira, e avaliar a produção animal em pastejo.
Alexandre Agiova e Ademir Zimmer acreditam que a adoção da tecnologia por parte de produtores como Jorge Camargo foi um divisor para os estudos e que ainda serão feitos ajustes na tecnologia para oferecê-la com exatidão. Entretanto, é certo, segundo eles, que o consórcio milho-guandu está apto para pequenas e grandes áreas, familiares ou em grande escala, "porque estação seca e boi precisando de reforço alimentar há em propriedades de todos os tamanhos", diz Zimmer.
A forrageira BRS Mandarim
O guandu empregado nas pesquisas (Cajanus cajan cv. Mandarim) é uma leguminosa forrageira, semiperene, de elevado teor proteico, digestibilidade e adaptabilidade. "A digestibilidade do material pode garantir maior concentração de proteína realmente aproveitada pelo animal", observa Rodrigo Gomes. Mas a BRS Mandarim apresenta também resultados satisfatórios para a recuperação de pastagens degradadas em sistemas de integração com braquiária, contribuindo para restabelecer a fertilidade do solo e melhorar o desempenho animal.
O aumento no ganho de peso vivo dos animais por hectare foi significativo. Segundo a pesquisadora Patrícia Anchão, comparando-se à pastagem degradada, ocorreu aumento no desempenho individual e na lotação animal por hectare. Na integração do guandu BRS Mandarim com a braquiária, o ganho de peso médio por animal foi 51% maior, cerca de 132 gramas a mais ao dia na primeira safra de implantação do consórcio. O ganho de peso por hectare também foi maior por safra, 55% na primeira e 170% na segunda safra.
Um dos pontos mais importantes da integração do BRS Mandarim com o pasto é, conforme o melhorista Rodolfo Godoy, o alto potencial para adubação verde, pela adição de nitrogênio no solo. "Por ser uma leguminosa, o guandu fixa nitrogênio nas raízes. Assim, o produtor recupera o pasto sem a necessidade de usar adubação nitrogenada. É uma maneira eficiente e prática de recuperar uma pastagem, gastando menos", afirma.
Ele ainda destaca que a planta auxilia na recuperação das propriedades físicas do solo, ao promover sua descompactação. Dessa forma, permite que o sistema radicular da gramínea consorciada atinja profundidade maior e seja mais resistente à seca. A linhagem BRS Mandarim pode ser plantada em qualquer tipo de solo, por ser resistente à baixa fertilidade, mas não tolera solos encharcados.
Congresso Mundial sobre Ilpf
De 12 a 17 de julho, Brasília vai sediar o Congresso Mundial sobre Integração-Lavoura-Pecuária-Floresta. Os maiores especialistas do mundo em intensificação sustentável se reunirão para apresentar trabalhos científicos e debater questões como aumento da produção mundial de alimentos, mudanças climáticas e sustentabilidade ambiental.
Fonte: Embrapa
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